Peça de exposição sobre tortura e escravidão
Nos dias que correm debate-se o problema da antiga escravatura de uma forma indirecta e por referência ao que se passa nos Estados Unidos com a remoção de estátuas de certas figuras históricas. Mas seja de forma indirecta ou directa, nesse ou noutros debates sobre o passado, é muito frequente confundir-se memória e História. Ao contrário do que geralmente se diz, a História não é escrita pelos vencedores — a memória sim, é imposta por eles. A História é escrita pelos historiadores e há-os de várias correntes ideológicas e a produzir trabalho cujo mérito não depende da eventual proximidade aos vencedores, mas sim da sua profundidade e solidez. A História deve ser sempre informada, crítica e plural. A memória não tem essas exigências. É parcial e selectiva — é a visão que um determinado grupo tem do passado — e é ela que costuma ser alvo de apropriações e imposições. Ora, a memória e a maneira como a usam são ou podem ser perigosas. Porquê? Porque há pessoas que acham, erradamente, que as memórias têm o mesmo rigor e valor da História. Acham, também, que podem impor a “sua” memória dos factos, invadir a História e calar os historiadores; há, até, quem diga que a História não precisa de sentinelas (para que — acrescento eu — o seu território seja mais facilmente invadido e tomado). Tudo isso tem sido muito evidente no debate sobre a antiga escravatura e sobre o que deve ser a nossa posição relativamente a ela, e é justamente sobre isso que quero contar-vos um episódio muito esclarecedor sobre o teor de veneno que as memórias “certas”, e os que se dizem seus paladinos e defensores, podem trazer.JOÃO PEDRO MARQUES2017
Compreender o passado requer ferramentas teóricas, trabalho e ética de investigação. O que não significa que os historiadores sejam infalíveis, e ainda menos que não possam ser interpelados e contestados.
Os "arquivos coloniais" foram durante muito tempo ignorados, ou ocultados, e a sua própria génese é uma parte do passado de grande interesse para estudo pelos historiadores contemporâneos. A questão da escravatura é do foro da memória individual e coletiva, e da História, mas também ganha atualidade por evolução do acesso a informação, que recentemente ganhou alento, até por decisões políticas internacionais, aplicando esse documento fundamental que é a Declaração dos Direitos Humanos a todo o Planeta Terra e a todas as populações.
A repressão pela Lei e pelo Estado de versões do passado é intolerável por quem defenda a liberdade, por muito que discordemos de uma e outra versão - e esta não é uma posição da História nem da memória, mas uma escolha política do presente em que vivemos como cidadãos, com memória, memórias, e mais ou menos partilha de resultados da investigação em História pela sociedade em geral.
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