domingo, junho 12, 2011

Lavar cidades




Tejo que levas as águas
correndo de par em par
lava a cidade de mágoas
leva as mágoas para o mar  

Lava-a de crimes espantos
de roubos, fomes, terrores,
lava a cidade de quantos
do ódio fingem amores  

Leva nas águas as grades
de aço e silêncio forjadas
deixa soltar-se a verdade
das bocas amordaçadas  

Lava bancos e empresas
dos comedores de dinheiro
que dos salários de tristeza
arrecadam lucro inteiro  

Lava palácios vivendas
casebres bairros da lata
leva negócios e rendas
que a uns farta e a outros mata  

Tejo que levas as águas
correndo de par em par
lava a cidade de mágoas
leva as mágoas para o mar  

Lava avenidas de vícios
vielas de amores venais
lava albergues e hospícios
cadeias e hospitais  

Afoga empenhos favores
vãs glórias, ocas palmas
leva o poder dos senhores
que compram corpos e almas  

Leva nas águas as grades
...  

Das camas de amor comprado
desata abraços de lodo
rostos corpos destroçados
lava-os com sal e iodo  

Tejo que levas nas águas


Manuel da Fonseca 

Sem comentários:

Ladrões de Bicicletas: A tirania do mérito

Ladrões de Bicicletas: A tirania do mérito : « Quem alcançou o topo, passou a acreditar que o sucesso foi um feito seu, uma medida do seu ...