9. O leitor lê o que quer, lê ao contrário até, e é sempre o último a escrever.
Ama e zanga-se, com sentido de posse, porque, mesmo que não o conheça de
carne e osso, o autor é seu. O autor sabe disso porque também é leitor: sabe que
o leitor tem na cabeça um autor que só existe na cabeça dele. Então o leitor quer dar-lhe
coisas, segredos mesmo. Recebi cartas de leitores que talvez mais ninguém pudesse ler.
A bondade dos estranhos coexiste com a violência dos estranhos, que coexiste com a
intimidade dos estranhos. É assim.
Há coisas radicais que só acontecem entre quem não se conhece.
10. Quem escreve está tão sozinho como cada um está sozinho até ao fim.
Depois, o texto entra, ou não, em relação com o mundo, mas isso só acontece
quando é lido. Produção e promoção já não são o autor, estão depois dele, venda e
compra ainda não são o leitor, estão antes dele. O único frente-a-frente real é de um
para um, escuro em volta, autor e leitor. Aí, quem escreve já não é aquele que está a ser
lido. A toupeira está na toca, o autor na cabeça do leitor. E se o leitor não estiver lá,
Ler mais aqui:ninguém está.
Alexandra Lucas Coelho
A toupeira e os leitores - PÚBLICO
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