sexta-feira, agosto 28, 2015

Português batucado



E agora mesmo, em Luanda, a capital de Angola, os jovens que cantam e dançam o kuduru e os rapazes que dormem nas ruas sem saberem bem porquê falam um português que já não se lembra do kimbundo, mas que é tecido de luandensidades linguísticas de uma resistência à urbanidade que os enxotou do seu veículo de crescimento betuminoso. 
Bem ouvimos as nossas zungueiras darem bué de maçada nos fiscais, xé!, os madíé já chegaram!, arreió, arreió (para dizer que o preço baixou), ou está passá feijão, é feijão frade, é feijão espera-cunhado, é feijão catarino, está passá feijão!, pela boca do gramofone chinês a pilhas. 
Mas é também no discurso oficial que ouvimos dizer “contribuir no desenvolvimento”, tão repetida expressão em que o verbo perde a preposição “para” que lhe fora destinada pela lei da língua. Como esta mudança, há bastantes outras, a lembrar-nos que toda a língua tem transformações, ou melhor, evoluções (Darwin), mas tem sempre uma gramática que lhe impõe regras.
A verdade final é que um troféu ou herança representa sempre um valor, um recurso que, no caso da língua, é vital para a nossa unidade nacional e para nos comunicarmos com o universo. Por isso, não somos assim tão livres de fazer com ela tudo aquilo que nos der na real gana. É urgente que a Escola angolana dê aos seus alunos bons professores com o português bem afi(n)ado na ponta da língua.


O portungolano como expressão da bantulusofonia - PÚBLICO

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